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segunda-feira, 31 de março de 2008

Missão Integral – a desnecessidade do nome e a necessidade do conceito*

Marcus Vinicius Matos**

C.S. Lewis dizia que a humanidade só anda pra frente quando uma geração compreende a geração imediatamente anterior a ela. Desafiados a pensar sobre a Teologia da Missão Integral, somos levados a crer que, graças a Deus, seu conceito influencia, hoje, toda uma geração de jovens comprometidos com o Evangelho de Jesus.

Todavia, isso leva a uma nova crise. Afinal, será que mais alguma coisa precisa ser dita sobre o tema? O que já não foi dito sobre Missão integral? Em um artigo publicado em 1994, Robson Cavalcanti atentava para o fato de que a Teologia da Missão Integral ficava “por fora” das igrejas, atingindo apenas os movimentos “paraeclesiásticos”. Perguntamos: será que isso mudou? Por outro lado, já ouvimos dizer que hoje a missão integral é feita em todo canto, mesmo por quem não sabe o que é a Teologia da Missão Integral. A prova disso seria o fato de que é praticamente impossível ver uma igreja evangélica na qual não exista pelo menos um trabalho de ação social.

Seja como for, de todas as aplicações possíveis da integralidade da missão, um assunto deveras sensível e de significativas diferenças entre as gerações que iniciaram a caminhada da Missão Integral em Lausanne e a geração de hoje, que pega o bastão, é a questão política. Mas não só a questão política eleitoral: nessa, os evangélicos já estão integrados, desde a ditadura. Trata-se da política que se faz também no Poder Judiciário; nas escolas e universidades; nas políticas coorporativas das empresas; e, sobretudo, no dia-a-dia comum do cidadão ordinário. E nisso, perguntamos: qual nossa capacidade de mobilização para lutar por direitos? Para promover a Justiça? Talvez não tenhamos explorado ao máximo o conceito de Missão Integral em sua relação com a política.

Como boa parte dos textos sobre Missão Integral foram escritos no contexto da Guerra Fria, era muito fácil perceber neles os embates ideológicos entre os conceitos clássicos de Esquerda e Direita. Hoje, no entanto, esses embates ainda existem, porém, com novos entornos. Não se trata mais de opor um comunismo despótico a um capitalismo ditatorial; trata-se de opor um “novo socialismo”, ou uma social democracia, a um neoliberalismo e a um governo de empresas multinacionais.

A Globalização parece ter gerado uma crise da qual o Estado-nação não conseguirá sair ileso. Ela não se restringe ao Estado: a crise global atinge também as estruturas culturais, políticas e sociais como um todo. Vivemos, nas palavras de Anthony Giddens, num “mundo em descontrole”, no qual o sistema político comum – com partidos políticos, fronteiras estatais e sentimento nacional – já não faz mais sentido. A grande oposição teórica que surge disso, segundo ele, seria entre um cosmopolitanismo e as diversas formas de fundamentalismo - no caso, cultural. Todavia, é necessário pensar de que forma essa oposição na cultura pode se refletir no contexto teológico.

Até mesmo o conceito tradicional de família foi abalado pela Globalização. Em recente estudo, um professor de sociologia francês alega que, na impossibilidade de definir um conceito de família na Europa contemporânea – devido a um número imenso de crianças que vivem em vários ambientes com pais divorciados, a casamentos entre pessoas do mesmo sexo, e ao surgimento de outras formas de família no estilo “friends” americano – define família pela “roupa suja”, ou seja, família seria aquilo que surge “quando duas pessoas compram uma máquina de lavar, ao invés de duas”. Isso é só pra ilustrar a gravidade do problema, e a necessidade de levar a sério a questão de “discernir os tempos” (I Crônicas 32:12), e ter uma pequena idéia de como o mundo mudou nos últimos 30 anos. É preciso compreender as mudanças para se posicionar diante delas.

No entanto, o que permanece inalterado? Certamente, a pobreza, a miséria e as - cada vez maiores - desigualdades entre os povos continuam presentes. Há quase 40 anos atrás, tratando de Missão Integral, Ronald Sider apontava para a necessidade de que cristãos ricos não se conformassem com os tempos de fome. Num capítulo que trata da questão do envolvimento político, ele aborda a importância de lutar contra a tirania das ditaduras marxistas e das empresas multinacionais, que ocorriam devido à concentração de poder econômico nos dois sistemas. Hoje, o professor Ulrich Beck, da universidade de Munique, depois de questionar a própria produção de estatísticas sobre o tema, conclui que o fluxo de renda dos países pobres para os países ricos aumentou; que o Globalismo Econômico tornou o mundo mais injusto do que era há alguns anos atrás.

Esse fato é um forte indício de que a Missão da Igreja continua a mesma. Apesar de mudanças políticas ocorrerem, a promessa de Jesus se cumpre a cada dia, e os pobres continuam entre nós. Contudo, há algo diferente: nossa responsabilidade aumentou na mesma proporção em que se multiplicaram os pobres.

Nesse início de Século XXI, Esquerda e Direita não são mais sinônimos de partidos políticos ou de ideologias bem definidas, mas sim de posicionamentos diante de questões como Direitos Humanos, Comércio Justo e Ecologia. Nesses dias, quando as relações econômicas globalizadas produzem mais pobreza e desemprego do que políticas públicas de educação; onde o sistema promove morticínios estruturais de classe nos presídios em detrimento de oportunidades de desenvolvimento humano; quando se criminaliza os pobres e se atribui às favelas os crimes do Estado. É nesse mundo que precisamos saber onde afincar a bandeira da Missão Integral.
Porém, mais do que a bandeira, importa resgatar o conceito. Assim, é útil o exemplo de Abraham Kuyper que, antes da criação disso que hoje entendemos como Teologia da Missão Integral, combatia um Estado que “causava condições sociais tão anormais que boa parte da população mal conseguia sobreviver”, e defendia uma política profundamente comprometida com a proteção aos trabalhadores e aos pobres.

Para os próximos anos, nosso principal desafio é esse: promover, de modo integral, a transformação da nossa política, da economia e da sociedade a partir dos conceitos Bíblicos. O que temos que fazer? Temos que recomeçar, cultivar a semente e reviver o espírito de Lausanne na nossa cidade. E como podemos fazer? Dentro de um mundo onde há ONGs e Movimentos Sociais que representam mais indivíduos que partidos políticos, e enquanto houver espaço para a democracia, é possível que o engajamento da Igreja de Jesus Cristo na Defesa de Direitos, movida pelo Espírito Santo, produza aquilo que tanto buscamos: Justiça.
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*Retirado so site: www.redefale.blogspot.com
** O autor é estudante da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde desenvolve pesquisa em Teoria do Estado. É também coordenador de Campanha da Rede FALE (www.fale.org. br).

quinta-feira, 6 de março de 2008

UM EXEMPLO DE ESPIRITUALIDADE BIBLICA



Introdução
Em toda a narrativa bíblica notamos a presença de homens que temeram a Deus e que desenvolveram uma espiritualidade a partir de um profundo relacionamento com Deus. Essa espiritualidade sadia e bíblica diz respeito a uma clara compreensão daquilo que somos e da Pessoa de Deus com quem nos relacionamos.

Temor, reverência, devoção, contrição, adoração, confiança e profundo desprendimento são características fundamentais para que Deus seja honrado pelo que é e para que haja um aprofundamento nesta espiritualidade que pretendemos desenvolver com Ele.

Neste relacionamento, onde temos Deus como alvo e Senhor de nossa espiritualidade, devemos entender que cada dia é um dia de aprendizado para nós seres humanos criados por Ele para o seu louvor e glória.

Dessa forma, encontramos na Bíblia exemplos de servos de Deus que desenvolveram uma espiritualidade coerente e respaldada nos Ensinos Sagrados. Personagens que aprenderam, em meio a situações contrárias e de profunda oposição, a ter e a manter esta espiritualidade bíblica.


O exemplo de um profeta
Um desses personagens que gostaríamos de destacar é o profeta Elias que carregava em seu nome o sinal de sua devoção e caráter - “Meu Deus é o meu Senhor!”.

No texto bíblico que registra os fatos mais marcantes da vida do homem de Deus, I Reis 17-19, notamos como sua vida foi marcada por eventos onde a graça e o poder de Deus foram evidenciados de forma bastante nítida. No entanto, também notamos um Elias com fraquezas e possuidor de uma personalidade marcada por momentos de melancolia acentuada.

No inicio do capitulo 17 de I Reis presenciamos o profeta vivenciando momentos de grande experiência com o sobrenatural, onde Deus manifesta a sua provisão através de corvos (v. 6), realiza um milagre na casa da viúva em Serepta (v. 14), ressuscita o filho da viúva (v. 22). Através desse ultimo fato a viúva pôde glorificar a Deus confirmando o ministério de Elias como profeta do Altíssimo (v. 24).

Porém, é no grande embate contra os profetas de Baal que o Deus de Elias, o nosso Deus, manifesta a Sua Grandeza, Majestade e Poder. Durante este evento podemos destacar os seguintes fatos: a) Elias confronta o Rei Acabe e o povo – “até quando vocês vão oscilar para um lado e para o outro?” (18.21); b) Logo em seguida, o profeta passa a restaurar o altar do Senhor que estava em ruínas (18.30-32); c) O profeta passa a clamar ao Senhor em oração e diz: “Responde-me, ó Senhor, responde-me, para que este povo saiba que tu, ó Senhor, és Deus, e que fazes o coração deles voltar para ti.” (18.37). Assim, Deus manifesta, mais uma vez, o seu poder e envia fogo como resposta a oração de Elias e ele consome todo o sacrifício e ainda lambe a água que estava ao redor; d) Como uma atitude imediata, o povo reverencia ao Senhor e declara em alta voz: “O Senhor é Deus! O Senhor é Deus!”.

Através destes fatos podemos retirar possíveis aplicações para a nossa vida devocional que de forma sucinta passaremos a destacar-las.



Espiritualidade a partir do exemplo
Há momentos em nossa vida cristã que nos afastamos da vontade de Deus para nós e isso leva que Deus use meios, ou pessoas, para nos confrontar e nos fazer amoldar a sua vontade. E diante desta confrontação Deus nos pergunta: “Até quando?”.

Até quando iremos balançar diante de outra possibilidade que não seja fazer a vontade de Deus? Até quando a possibilidade de realizarmos os nossos sonhos será a mais prazerosa e encantadora do que cumprir a vocação e o ministério que o Senhor nos concedeu? Até quando? Até quando? Até quando? .... Ressoa a pergunta do Senhor.

No entanto, além de nos confrontar, o Senhor envia a possibilidade de nos voltarmos para Ele e termos o nosso altar restaurado. Um altar onde o nosso EU é sacrificado todos os dias com as nossas vontades e desejos pecaminosos. Onde só existe lugar para oferecermos o mais profundo sacrifício que honra e glorifica ao nosso Pai.

Então, só assim, com as nossas consciências confrontadas e o nosso altar restaurado é que Deus pode manifestar o seu poder em nossas vidas e no meio daqueles que estão ao nosso redor. Como bem enfatizou Josué as vésperas da travessia do Jordão: “Satinfiquem-se, pois amanhã o Senhor fará maravilhas entre vocês.” (Js. 3.5).


Espiritualidade em meio às fraquezas
Mesmo assim, todas estas manifestações divinas que marcaram a vida e ministério de Elias não o livraram de ser seduzido por seu próprio coração e por suas fraquezas.

Em I Reis 19.3, lemos: “Elias teve medo e fugiu para salvar a sua própria vida.” Mas de que, ou de quem, Elias teve medo? Como um profeta que momentos atrás tinha enfrentando com ousadia a afronta de 450 profetas de um deus estranho viria a temer agora? Elias temeu por sua vida por causa das afrontas e ameaças que a rainha Jezabel fez contra ele, por isso ele fugiu.

Aqui, o profeta, parece irreconhecível. Diante dos profetas de Baal Elias demonstra valentia, coragem e um espírito destemido, porém aqui um ser humano fraco, frágil e temeroso por sua vida.

Com isso aprendemos que na vida cristã passamos por momentos semelhantes ao de Elias. Momentos onde Deus nos restaura, nos concede a sua graça e a sua unção para realizarmos a sua obra. Mas por causa de nossas próprias imperfeições, provocadas pelo pecado, falhamos e por isso deixamos de nos sentir super-crentes, poderosos e cheios de nós mesmos e passamos a sentir que somos realmente humanos, impotentes, vulneráveis e totalmente dependentes de Deus e de sua graça.

E para ensinar isso ao profeta Deus vai mais uma vez ao encontro dele, que estava escondido em uma caverna. Então, Deus lhe pergunta: “O que você está fazendo aqui, Elias?”. Mas parece que o profeta não entende a pergunta divina, então Deus se manifesta novamente, porém, agora, de outra forma especial. Deus usa um terremoto, fogo, no entanto a presença de Deus é manifestada através de um “murmúrio de uma brisa suave.” E assim, o Senhor, concede a Elias mais uma chance para responder a sua pergunta: “O que você esta fazendo aqui, Elias?”.

Esta é a grande pergunta que deveríamos responder para nós mesmo quando o Senhor que conduz a História nos leva para a caverna. Para aprender o que o Senhor me trouxe para aqui? Qual o objetivo de eu estar aqui na caverna?

Quando o profeta entendeu isso Deus pôde o encaminhar para a conclusão do seu ministério. Só depois de passar pela caverna é que ele pode continuar o ministério que recebeu do Senhor. Então, o Senhor falou para Elias: “volte pelo caminho por onde veio, e vá para o deserto de Damasco.” (19.15) A partir daqui o profeta recebe a missão de ungir aos lideres do povo e aquele que seria o seu sucessor (19.19-21).


Conclusão
Através do exemplo da espiritualidade que o profeta Elias desenvolveu em sua vida podemos entender que Deus deseja a nossa restauração. Apesar das nossas falhas Ele deseja nos usar na realização de sua obra, basta, tão somente, termos o altar de nossas vidas preparado diariamente para ouvir o que Ele tem a nos dizer e disposição em nosso coração para sacrificar vontades, sonhos e desejos e nos dobrarmos ao Senhor que é Rei do nosso viver.


Que Deus nos ajude!


Patrick Cezar da Silva
Sociólogo e Pensador Cristão
http://www.espiritoemissao.blogspot.com/

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*As citações bíblicas são da Nova Versão Internacional da Biblia (NVI).