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segunda-feira, 15 de setembro de 2008

A espiritualidade da vergonha - por Ricardo Barbosa de Sousa *



Na sociedade moderna, a tolerância transformou-se na maior de todas as virtudes. Aceita-se tudo, não se critica nada. O que mais me preocupa não é a capacidade de compaixão e paciência que a tolerância produz em nós, mas a ausência, cada vez maior, de valores e princípios absolutos que nos ajudam a separar o justo do injusto, o certo do errado.

O sociólogo francês Gilles Lipovetsky, em seu livro “A Sociedade Pós-Moralista”, descreve assim a tolerância na cultura moderna: “A tolerância adquire uma maior fundamentação social não tanto pelo fortalecimento da compreensão dos deveres de cada um perante o próximo, mas em razão de uma nova dimensão cultural que rejeita os grandes projetos coletivos, exaurindo de sentido o moralismo autoritário, diluindo o conteúdo das discussões ideológicas, políticas e religiosas de toda a conotação de valor absoluto, orientando cada vez mais os indivíduos rumo à sua própria meta de realização pessoal”. Ou seja, a ausência de uma consciência coletiva, a rejeição a qualquer verdade que seja absoluta e a busca pela realização pessoal geram uma forma perigosa de tolerância.
Entretanto, o perigo da rejeição a uma verdade absoluta está no fato de que ser tolerante hoje implica, necessariamente, não julgar, não ter mais critérios que separem o bem do mal, o justo do injusto; e, uma vez que não julgamos mais, poucas coisas nos chocam ou abalam e, quando o fazem, é por pouco tempo. Vivemos um estado de normalidade caótica, de paz frágil, de tranqüilidade tão relativa quanto os nossos valores.
Na oração de confissão de Daniel há uma declaração que vem se tornando cada dia mais rara entre nós: “A ti, ó Senhor, pertence a justiça, mas a nós, o corar de vergonha” (Dn 9.7). Isto não acontece mais. Somos demasiadamente tolerantes para “corar de vergonha”. Mesmo diante de fatos trágicos e deploráveis que vemos todos os dias, o máximo que conseguimos é uma indignação passageira. Porém, é a possibilidade de corar de vergonha que não me permite rir da corrupção, achar normal a promiscuidade, conviver naturalmente com a maldade e a mentira, ou, ainda, achar graça da injustiça.
Vivemos numa cultura que se orgulha do pecado, glamourizando-o através dos meios de comunicação, fazendo das tribunas públicas um palco de mentiras, organizando marchas para celebrá-lo, rindo da corrupção, exaltando a esperteza. E ninguém fica corado de vergonha.
Daniel contrasta, de um lado, a natureza justa de Deus e, de outro, a corrupção e a injustiça do seu povo. Ele só é capaz de fazer isto porque sua ética e moral estão ancoradas em verdades absolutas sobre as quais não pode haver tolerância. A conclusão a que ele chega é que, diante da justiça divina e do quadro trágico de um povo que se orgulha de sua maldade, o que sobra é o “corar de vergonha”.
Ele nos apresenta aqui a importância de uma vergonha saudável e essencial na preservação da dignidade humana e espiritualidade cristã. A vergonha aqui é a virtude que nos ajuda a reconhecer nossos erros, limitações, faltas e pecados porque ainda somos capazes de perceber que existe algo melhor, mais belo, mais sublime, mais nobre, mais justo, mais santo e mais humano pelo qual vale a pena lutar. A vergonha nos impõe um limite. É por isto que o caminho para o crescimento e amadurecimento passa pela capacidade de ficar corado de vergonha diante de tudo aquilo que compromete a justiça e a santidade. No caminho da santidade lidamos com o amor, verdade, bondade, justiça, beleza, entrega, doação e cuidado. A falta de vergonha nos leva a negar este caminho e optar pela mentira, manipulação, engano, falsidade, hipocrisia e violência.
“Corar de vergonha” é uma virtude que falta na experiência espiritual moderna, a virtude de olhar para o pecado que habita em nós, a mentira e o engano que residem nos porões da alma, a injustiça que se alimenta do egoísmo, a malícia que desperta os desejos mais mesquinhos, e se entristecer. Precisamos reconhecer que foram os nossos pecados que levaram o Santo Filho de Deus a sofrer a vergonha da cruz. Quando olhamos para a cruz e contemplamos nela a beleza e a pureza do amor, só nos resta “corar de vergonha”.
* Ricardo Barbosa de Sousa é pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto e coordenador do Centro Cristão de Estudos, em Brasília. É autor de “Janelas para a Vida” e “O Caminho do Coração”.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

BOM É ESPERAR! – por Patrick Cézar


"Bom é ter esperança, e aguardar em silêncio a salvação do SENHOR". (Lm. 3.26)


Dizem que a pressa é a inimiga da perfeição. Então, a virtude de esperar deve ser a melhor amiga da perfeição. Coisa que está ausente em nossa geração. Esperar hoje é um mal. Quem nunca ficou estressado por ficar esperando a fila do banco andar, ou ficou desesperado porque a conexão da internet ficou lenta demais só porque ela é discada.

Vivemos na geração instantânea, onde tudo deve acontecer de forma mais rápida possível. Esperar já não é mais uma virtude e sim uma falha no bom atendimento ou na prestação de serviços. Em pesquisa recente vinculada na mídia falava-se do tempo que as pessoas consideravam demorado para aguardar o atendimento via telefone. A maioria das pessoas considerava 2 minutos tempo demais para se esperar ao telefone. Hoje, mais do que nunca, o lema: “Time is money!” (Tempo é dinheiro!) fez tanto sentido. Para contrariar este pensamento moderno (ou pós-moderno) o profeta Jeremias nos ensina que: Bom é esperar! Bom é ter esperança! Bom é aguardar!

Durante a vida cristão Deus nos permite passar por situações em que devemos fazer como o profeta Jeremias, “...aguardar em silêncio...”. Para nós, modernos (ou pós-modernos), muitas vezes, isso se torna muito mias difícil esperarmos e além do mais esperarmos em silêncio. Queremos logo buscar os nossos direitos e reivindicar a justiça que achamos certa para as nossas vidas. Hoje, quando a Teologia da Prosperidade vem pregando que o crente deve exigir de Deus os seus direitos obtidos por herança através de Cristo na cruz, devemos entender que Deus é o Senhor da História e que ele a conduz para o cumprimento do seu propósito, mesmo que aos nossos olhos as coisas demorem a acontecer. A visão de Deus é geral e vê o principio e o fim de uma só vez. Nós temos uma visão limitada e por isso nos desesperamos com as adversidades e tribulações. Mas, quando temos isso em mente não nos desesperamos, mas simplesmente descansamos.

Jeremias entendia muito bem isso e por este motivo pôde expressar que a melhor coisa a se fazer é “aguardar em silêncio a salvação do SENHOR”. Quando confiamos e esperamos no Senhor temos a certeza que todas as coisas que nos acontecem durante o período que esperamos servirão para o nosso crescimento e para que tenhamos o nosso relacionamento com Ele cada vez mais fortalecido (cf. Rm. 8.28).

Viver em meio à adversidade e ainda assim manter a esperança no Senhor é uma coisa que aprendemos muito bem com o profeta Jeremias. Em vários trechos do livro de Lamentações de Jeremias vemos o profeta apresentando a situação de adversidade e de miséria do seu povo e a postura correta que os servos de Deus devem ter.

As misericórdias do SENHOR são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim; Novas são cada manhã; grande é a tua fidelidade.
A minha porção é o SENHOR, diz a minha alma; portanto esperarei nele.
Bom é o SENHOR para os que esperam por ele, para a alma que o busca.
Bom é ter esperança, e aguardar em silêncio a salvação do SENHOR.
(Lamentações 3.22-26)


O profeta chama a atenção do povo para os atributos de Deus e pelo que Ele e por este motivo podemos aguardar com paciência o seu agir. E acima de tudo: só conseguimos esperar pelo seu agir porque é ele que nos sustenta e leva a alcançarmos o seu propósito em nossas vidas.

Para o apóstolo Paulo a paciência está ligada à perseverança e à obra da justificação em nossas vidas. Perceba:

“Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo; Pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes, e nos gloriamos na esperança da glória de Deus.
E não somente isto, mas também nos gloriamos nas tribulações; sabendo que a tribulação produz a paciência, e a paciência a experiência, e a experiência a esperança.
E a esperança não traz confusão, porquanto o amor de Deus está derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado.”
(Romanos 5.1-5)

Dessa forma, se somos justificados pelo Senhor temos em nós a presença do Santo Espírito que nos orienta e nos conduz a perseverança. E mesmo que passemos por tribulações termos a certeza que o Senhor com a sua graça e com a sua misericórdia irá nos dá forças e nos ajudar em nossa caminhada até chegarmos em nosso lugar de descanso eterno, onde não haverá mais a tristeza, a dor, a tribulação e a nos veremos livre completamente do ação do pecado e lá estaremos para sempre com o Senhor (cf. João 14.1-3). Bom é esperar pela salvação que vem do Senhor!


Somente a Deus seja a Glória!